domingo, 5 de dezembro de 2010

A favor do desconforto

Por Duda Martins

O riso nervoso tomou conta do teatrinho Capiba na programação da IV Mostra Capiba de Teatro, que teve início ontem com muito êxito. Sabe aquele riso amarelo, meia-boca, de quem escuta duras verdades sobre você mesmo e não sabe como reagir? Porque a solidão não é um tema risível, mas dependendo de como ela se apresente, e principalmente se for bem longe, num palco, de preferência, para parecer bem irreal, melhor. O fato é que na apresentação de Solteira, Viúva, Casada e Divorciada, todo mundo ria bem alto, aliviado por não ser nós mesmos ali em cima admitindo a nossa solidão; e todo mundo ria muito nervoso, com medo de alguém descobrir que ali em cima éramos nós mesmos.

O primeiro acerto da peça dirigida por Aluízio Guimarães e encenada pela experiente Maria Alves, aconteceu antes de tomar forma, ainda durante a escolha dos textos: ricos em significados, conteúdo, textos que sabem provocar um misto de sensações no espectador. Penso que Noemi Marinho, Maria Adelaide Amaral, Luiz Arthur Nunes e Regiana Antonini quando acabaram suas obras pensaram: não quero ver ninguém confortável. E não tem como. Na peça, o riso, num piscar de olhos vira tragédia. E ninguém chora só porque nos dois segundos seguintes vira riso de novo. O besteirol é pertinente, a sacanagem e o palavrão também o são. Os autores, Aluízio e Maria encontraram a forma certa de dar uma chacoalhada no público e através do riso, fazer pensar. Poucos conseguem esse resultado.

Depois de divagar sobre comédias/tragédias da alma, penso que Maria deve ter aprendido bastante nesse processo de encarnar quatro mulheres tão diferentes. E assistindo tive a impressão de que se jogou sem rede de segurança nesse projeto. No entanto, o trabalho de ator segundo métodos stanislavskianos é uma tarefa árdua quando se aplica em apenas uma personagem, quem dirá quatro. Mesmo com toda a garra e apropriação das “suas” moças, Maria vez por outra parece cansada de em tão pouco tempo ter de nadar até o infinito particular de cada uma, e quando finalmente se sente à vontade, é hora de, novamente, trocar de alma e espírito.

Esteticamente, a direção optou pelo limpo, o que é válido, visto que o tema já preenche todo o espaço. A pouca cenografia e iluminação, no entanto, merecem um pouco mais de atenção por parte da produção. A proposta grotowskiana do pouco, pode chamar atenção pelo descuidado, e não por sua essência proposital. Teatro pobre não é teatro descuidado. A mesma opinião se aplica aos vídeos, que se tornam um recurso excelente, se bem cuidados e pensados com mais ritmo. No geral, o monólogo surte efeito na medida em que se sai do teatro não com problemas resolvidos, mas com uma convicção, de que poderia ser eu a falar: Você não está só, plantonista Duda, bom dia! E rir do besteirol que é a vida.

--

Sobre a crítica...

Duda Martins

É Jornalista e trabalha como repórter no Caderno C (Jornal do Comercio PE). Em 2010 fez as coberturas de Turnê Dionisíacas Teatro Oficina no Recife, Festival Palco Giratório, Janeiro de Grandes Espetáculos e participou como critica do Seminário Internacional de Crítica Teatral.

Nenhum comentário:

Postar um comentário